W20 coleta propostas para reduzir desigualdade de gênero | G20 no Brasil

Redação
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Todo dia, mulheres pelo mundo afora dedicam 12,5 bilhões de horas não remuneradas à limpeza da casa, preparo de refeições e cuidado com crianças e idosos. Se fosse pago, o trabalho somaria pelo menos US$ 10,8 trilhões por ano — mais que três vezes o que movimenta a indústria global de tecnologia, segundo estudo da Oxfam, organização não governamental voltada à justiça e combate às desigualdades.

Mais atarefadas em casa, as mulheres perdem em renda e espaço fora da esfera doméstica. Entre as brasileiras, a taxa de participação no mercado de trabalho é de 52%, em comparação com 72% registrados no universo masculino, aponta outro estudo do FGV Ibre. Quanto aos rendimentos, os homens ganham em média 25% a mais.

As dificuldades persistem no mundo do empreendedorismo. Segundo pesquisa do Sebrae, 55% das micro e pequenas empresárias acham difícil conseguir crédito para fazer o negócio. Entre os homens, a parcela é menor: 33%.

A criação de propostas para políticas públicas que possam mudar estatísticas como essas é prioridade do W20 (Women 20) — um dos grupos de engajamento da sociedade civil na estrutura do G20, formado por integrantes do mundo da academia, do empreendedorismo e do terceiro setor.

Neste ano, o W20 está dividido em grupos de trabalho responsáveis por elaborar até junho propostas com foco em cinco grandes pilares: economia do cuidado; empreendedorismo e acesso ao capital, participação feminina no universo da tecnologia; justiça climática; e combate à violência contra as mulheres — todos eles também com pautas relacionadas a mulheres não brancas.

Cada grupo de trabalho terá no comando uma brasileira e pelo menos uma delegada estrangeira. Ainda em fase inicial de elaboração, as recomendações devem ser entregues em junho aos sherpas, os representantes dos líderes do G20.

“Talvez a única instância em que as mulheres têm um pouco mais de facilidade para acessar capital no Brasil e no mundo é o microcrédito”, afirma a Maria Rita Spina, delegada da área de finanças e acesso ao capital e cofundadora do movimento Mulheres Investidoras Anjo (MIA). “Mas aí os recursos envolvidos são muito pequenos e não permitem que o negócio cresça e se desenvolva”, pondera.

Segundo ela, entre os entraves ao acesso ao crédito convencional está a falta de garantias, pois as mulheres tendem a ter menos bens. Na análise de crédito, também muitas vezes pesa contra o tempo gasto fora do mercado de trabalho por conta da maternidade ou cuidados com outros familiares, acrescenta ela.

Outros obstáculos são menos palpáveis, seja no mundo dos financiamentos ou do venture capital. “A maioria das pessoas que escolhe para onde vai o dinheiro são homens que, com uma série de vieses inconscientes, muitas vezes acham que a mulher vai dar menos atenção para a empresa do que para famílias”, diz a delegada. E exemplifica: “Estudos que comparam pitches feitos por homens e por mulheres na busca por recursos de investidores mostram que elas são muito mais questionadas sobre a disposição para fazer o negócio crescer.”

Entre as formas de combate ao problema, o W20 deve propor formas de garantia alternativas e a criação de esquemas de financiamentos mistos, formados por recursos públicos e privados. “O IFC [International Finance Corporation] acaba tendo esse tipo de estrutura, mas não no Brasil ainda”, diz ela, referindo-se ao braço do Banco Mundial voltado para o fortalecimento do setor privado para combater a pobreza em países em desenvolvimento, muitas vezes com a alocação de recursos a instituições financeiras.

O grupo também discutirá propostas de mudanças na forma de pontuação de crédito, com formas alternativas para micro, pequenas e médias empresas lideradas por mulheres. “É preciso olhar a análise de crédito com lentes de gênero e, no caso, ainda com lentes especiais para raça e etnia”, diz ela.

Também está na mesa a criação de programas de apoio financeiro, tecnológico e comercial a negócios sociais e startups que abordem os objetivos de desenvolvimento sustentável do G20, com foco em clima, energia e segurança alimentar.

“Outro ponto que estamos olhando de forma muito forte é a questão do acesso a mercados”, afirma a presidente da delegação brasileira, Ana Fontes, fundadora da Rede Mulher Empreendedora. Com isso em mente, o grupo está discutindo propostas para priorização de micro, pequenas e médias empresas lideradas por mulheres nas compras públicas.

O W20 também deve propor políticas públicas para incentivar a participação feminina no campo da ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM, na sigla em inglês), com preponderância masculina “Se a gente tiver mais mulheres e meninas em áreas de STEM, você vai ter mais empreendedoras economicamente bem sucedidas e executivas ocupando posições melhores”, afirma Fontes. “Veja o caso das startups que são consideradas unicórnios: os fundadores vêm em peso dessas áreas”, exemplifica.

A criação de diretrizes para políticas educacionais está entre as prioridades. “A educação pode quebrar estereótipos e tanto trazer mais mulheres para áreas relacionadas à tecnologia como possibilitar que outras possam ganhar algum tipo de competência digital para não ficarem muito desfavorecidas no mercado de trabalho”, afirma a delegada responsável pelo grupo Camila Achutti, presidente da Somas, ONG com foco em pesquisa sobre tecnologia nas práticas educacionais.

A economia do cuidado estreia neste ano com um dos grupos de trabalho próprio no W20. Entre os tópicos em análise, estão formas de remuneração desse trabalho. “Estamos estudando diversas políticas públicas, como, por exemplo, o caso da Argentina, que inclui o tempo dedicado pelas mães ao cuidado dos filhos na contagem do tempo de serviço aposentadoria – algo que deveria valer também para os homens”, diz Ana Fontes. Segundo ela, a criação de licenças parentais, que possam ser divididas entre homens e mulheres para cuidado das crianças, como ocorre em países escandinavos, é outro ponto que pode ser discutido.

Fonte: Externa

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