A desancoragem persistente das expectativas de inflação para os próximos três anos reflete, em parte, as incertezas no processo sucessório do Banco Central e, de outro lado, a desconfiança com o desempenho fiscal do país, afirmou o economista e ex-diretor de assuntos internacionais do BC, Alexandre Schwartsman. O especialista participou nesta quinta-feira (11) do “Country Risk Brasil”, promovido pela Coface.
Segundo o economista, “é expectativa de inflação para 2025, 2026 e 2027, um período no qual tem um horizonte mais do que suficiente para que o Banco Central calibre a política monetária”. Conforme Schwartsman, “essa é a expectativa da pesquisa Focus, mas se a gente for para um outro conjunto de dados, olhando para expectativa de inflação embutida na diferença entre o rendimento nominal dos títulos do Tesouro e o rendimento dos títulos do Tesouro indexados à inflação, a percepção é ainda pior”. De acordo com o ex-diretor do BC, essa métrica mostra uma estimativa de inflação futura “perto de 4% para os próximos anos e em 5% a perder de vista”.
Schwartsman afirmou ver duas questões que influenciam esses resultados. “Não é nada pessoal, mas aparentemente, não há uma crença forte de que o BC seja capaz ou esteja disposto a perseguir a meta de inflação propriamente dita”. Na visão do economista, “parte da história pode estar ligada a uma questão de transição da diretoria do banco central”.
Conforme o especialista, existe um temor no mercado sobre a possibilidade de a autoridade monetária ter uma diretoria mais sucetível à influência política.
Outro lado das incertezas que parecem rondar as expectativas vem do desempenho fiscal brasileiro. “Um parte importante dessa história está ligada ao desempenho fiscal da economia brasileira. Há uma dificuldade que o governo tem no sentido de entregar a as suas metas fiscais. O que a gente vê, na verdade, é que existe uma incerteza considerável sobre a capacidade da política fiscal estabilizar o endividamento. A ideia de que arcabouço fiscal seria capaz de entregar esse resultado, eu acho uma ideia risível.”
Na visão de Schwartsman, dinâmica de crescimento do gasto obrigatório, “cedo ou tarde, redunda no gasto discricionário, sendo espremido até que o governo fale não aguento mais e muda a regra, como mudou o teto de gastos“. Para o ex-diretor do BC, “como, enfim, vai mudar a regra do arcabouço e qualquer regra que a gente tenha criar nesse sentido”.
Para Schwartsman, “nós somos muito bons em criar regras fiscais, a gente só não é muito bom em cumprir as regras que a gente cria, não é?” Na visão do especialista, “quando a gente descumpre as regras, a gente arruma um jeito de não ter que passar pelas sanções”. Então, ressaltou, “parte das persistência no que diz respeito à perspectiva de inflação à frente reflete exatamente isso”. E “a outra parte desse processo acho que reflete a incerteza que cerca a própria sucessão no banco central”.
Schwartsman reforçou ver a experiência de autonomia do BC como algo muito importante. “O mandato dos dirtores e do Roberto Campos Neto [presidente do BC] é um avanço institucional importante”. No entanto, “não dá para ignorar que você faz uma regra, de um lado, as pessoas adaptam seu comportamento a essa regra nova”. Nesse sentido, como a indicação vem do Executivo, “obviamente não vou colocar lá alguém que eu não tenha, para colocar de modo suave, um bom canal de comunicação”.
O economista afirmou que “muitos [do mercado] veem nessa história o risco de repetição do fenômeno que a gente observou quando Alexandre Tombini era presidente do BC, que, obviamente, não seguiu a cartilha de metas para inflação e, em algum momento, acabou exigindo um esforço muito maior de política monetária para corrigir”.