De parada cardíaca a engasgo: médico ensina manobras de primeiros-socorros; veja vídeo

Redação
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Um amigo, sua mãe ou seu avô te diz que está com uma dor no peito, de um tipo que nunca tinha sentido antes. A pessoa fala com você, quando, subitamente, perde a consciência e cai. Você, então, se aproxima e percebe que a respiração está ofegante (respiração agônica ou gasping) ou que a vítima nem mesmo respira. É uma parada cardíaca, situação com a qual grande parte de nós provavelmente irá se deparar um dia, já que problemas cardiovasculares são as principais causas de morte no mundo.

De acordo com a Associação Americana do Coração (AHA, na sigla em inglês), mais de 135 milhões morrem de causas cardiovasculares a cada ano.

Globalmente, a incidência de parada cardíaca fora de hospital varia de 20 a 140 por 100 mil pessoas. Segundo o médico cardiologista e intensivista, Agnaldo Piscopo, do Centro de Treinamento em Emergências da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp), a maioria delas, mais de 70%, ocorrem em casa.

Massagem cardíaca salva vidas Foto: LIGHTFIELD STUDIOS/Adobe Stock

O que mais assusta, no entanto, é que a taxa de sobrevivência dessas pessoas varia de 2% a 11%, de acordo com a AHA. Não precisava ser assim. Há um consenso, com base em uma série de estudos, de que a chance de um paciente em parada sobreviver cai de 7% a 10% a cada minuto sem assistência adequada. “No final de 10 minutos, a chance é praticamente zero”, diz Piscopo.

O que fazer?

Após chamar socorro – ligar para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) no 192 –, é essencial iniciar o que chamamos popularmente de massagem cardíaca (ressuscitação cardiopulmonar ou RCP) até a chegada de um desfibrilador, equipamento que ajuda a reverter arritmias (disfunção dos impulsos elétricos do coração que podem modificar o ritmo cardíaco).

A avaliação de médicos é que, de maneira geral, cada vez mais pessoas conhecem a massagem, mas ainda não é o suficiente. “Nos meus mais de 30 anos de experiência, menos de 20% das vítimas recebem a ressuscitação cardiopulmonar antes do resgate chegar”, estima Piscopo.

Por isso, o Estadão convidou Piscopo ao nosso estúdio para dar dicas de como enfrentar paradas cardíacas e outras emergências comuns, como engasgamento, afogamento e desmaios. Segundo ele, se atendêssemos melhor pacientes em parada, por exemplo, conseguiríamos salvar 60 mil pessoas por ano no Brasil. Confira nosso bate-papo no vídeo:

Prevenção

De acordo com Piscopo, os problemas cardiovasculares estão matando indivíduos cada vez mais jovens ao redor do mundo. Conforme mostrou o Estadão, o Brasil teve aumento de cerca de 62% na quantidade de mortes de mulheres de 15 a 49 anos por infarto de 1990 para 2019, segundo dados da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC).

Na faixa etária de 50 a 69 anos, o número quase triplicou, com alta de aproximadamente 176%. Um dos motivos foram as mudanças no estilo de vida, que levaram a mais sedentarismo, estresse, entre outros fatores de risco.

Segundo Piscopo, as principais atividades protetoras são: cessar tabagismo (de preferência, nunca fumar, seja cigarro tradicional ou eletrônico); controlar o peso, com exercício físico e uma alimentação saudável; monitorar e controlar os níveis de colesterol; e ter uma boa qualidade de sono. “Com prevenção, vamos conseguir reduzir (paradas e mortes), mas não vai conseguir zerar.”

O médico cardiologista e intensivista, Agnaldo Piscopo, do Centro de Treinamento em Emergências da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp), no estúdio da TV ‘Estadão’ Foto: Bruno Nogueirão/Estadão

Infarto

Por isso, precisamos estar preparados. E o primeiro passo é saber reconhecer a emergência diante de nossos olhos.

Quando o assunto é parada cardíaca, a principal causa é o infarto, de acordo com Piscopo. A condição é descrita como a morte das células de uma região do músculo do coração.

Segundo o Ministério da Saúde, a principal causa é a aterosclerose, uma doença na qual placas de gordura se acumulam no interior das artérias coronárias. Isso pode levar a uma arritmia, que, por sua vez, resulta em uma parada.

“O coração é um músculo que se contrai e relaxa. É uma bomba. Recebe e manda o sangue para o corpo. Quem que nutre o coração? As artérias, que são caninhos que passam ali pelo músculo. Elas podem ter uma obstrução, faz uma placa de ateroma e pode formar um coágulo. Esse trombo oclui (obstrui) completamente a artéria, manifesta dor, e irrita eletricamente o coração”, descreve Piscopo.

“O coração começa a bater a 300 vezes por minuto. Tão rápido que não consegue encher. Quando não consegue ‘encher’, para de mandar sangue para ele mesmo e para o cérebro.”

Antes de evoluir para uma parada, a maioria das pessoas sente dor no peito, de acordo com Piscopo. “Começa no peito e pode ir para o braço, as costas, a região do queixo, com náusea e vômito. Às vezes, pode enganar. Pode doer na região da ‘boca do estômago’.” Idosos, mulheres e pessoas com diabetes podem ter infarto sem uma grande manifestação de dor, com mal-estar indefinido.

  • Sentiu uma dor no peito? Avise quem estiver perto de você. Se estiver sozinho, ligue 192. Não se isole.

Caso a pessoa esteja consciente, mantenha-a imóvel, deitada ou sentada. Ligue também para o SAMU e explique exatamente o que está ocorrendo, e o que você sabe sobre o paciente, como se tem diabetes.

“Toda pessoa que tem um mal-estar súbito, enquanto estiver consciente, estamos em vantagem. Mas não se engane. Chame ajuda imediatamente, não precisa esperar nada, não é para medir a pressão. Enquanto está acordado, tem que aproveitar esse tempo.”

Segundo Piscopo, uma medida que pode ser indicada pelo técnico do SAMU, ainda no telefone, é de administrar ácido acetilsalicílico (o AAS infantil). “Isso reduz o risco de mortalidade em cerca de 20%, porque o AAS começa a ‘trabalhar’ no coágulo. E se não for infarto? Se a pessoa não é alérgica e não tem sangramento, não vai fazer nada, é inócuo.”

  • Peça ao paciente para mastigar e engolir três comprimidos de AAS infantil não tamponado. Exceto se: ele não quiser, for alérgico ou tiver algum tipo de sangramento ativo (a pessoa vomita sangue ou tem as fezes escurecidas, por exemplo).

Parada cardíaca, e agora?

Se a pessoa perdeu a consciência ou se você já a encontrar desacordada, cheque se o cenário apresenta algum risco para a sua segurança. Caso não, vá até a altura dos ombros, chacoalhe o indivíduo e tente chamá-lo. Sem resposta? Confira também a respiração. Peça para que alguém ligue para o 192 e inicie o protocolo de massagem cardíaca. Está sozinho? Ligue, coloque no viva-voz e comece as compressões.

O passo a passo da RCP é:

  • Ajoelhe-se ao lado da vítima, na altura do tórax, ou seja, o osso do peito;
  • Use os mamilos/mamas para encontrar a “região central”;
  • Coloque as mãos sobrepostas e espalmadas sobre essa região;
  • Mantenha os braços esticados;
  • Inicie as compressões no peito.

São necessárias de 100 a 120 compressões por minuto. Músicas que tenham de 100 a 120 beats (batidas) por minuto podem ajudar a encontrar o ritmo. A mais famosa, com 103 beats por minuto, é Stayin’ Alive, do Bee Gees.

  • Uma dica importante, reforçada pela AHA: não se incline sobre a vítima. Isso pode levar a uma liberação incompleta da parede torácica. É preciso haver uma expansão total do tórax após a compressão – “deixar o peito voltar” -, sem retirar as mãos do peito.

Isso continua até que um desfibrilador chegue pelo SAMU ou, de preferência, já esteja no ambiente onde a vítima está. Médicos defendem a presença desses aparelhos em locais públicos.

As compressões continuam enquanto alguém liga o desfibrilador, posiciona os eletrodos no tórax do paciente e encaixa o conector dos eletrodos. “Analisando ritmo cardíaco”, alerta a máquina. Pare as compressões e, se ela recomendar o choque, aperte o botão. Caso a vítima seguir desacordada, retome as compressões.

Pode não parecer, mas cansa bastante. Por isso, o ideal é que cada vez mais pessoas saibam executar a manobra, afinal, a qualidade das compressões importa. Piscopo aconselha fazer revezamento a cada dois minutos.

A maioria das pessoas não atende os outros porque acha que pode causar mal. ‘E se eu quebrar uma costela? Se eu fizer errado? Se você é a única pessoa que está ali, tem treino, você vai fazer o seu melhor, de preferência com orientação de alguém do SAMU. Pode quebrar uma costela nas compressões? Pode, mas é melhor uma costela quebrada do que um paciente que não sobreviva.

Agnaldo Piscopo, cardiologista

AVC

Outra emergência comum, que figura entre as principais causas de morte, embora não costume evoluir para parada cardíaca, segundo Piscopo, é o acidente vascular cerebral (AVC), que ocorre quando vasos que levam sangue ao cérebro entopem ou se rompem, conforme explica o Ministério da Saúde.

“A pessoa está conversando, e de repente começa a ficar com a voz empastada, enrolada, ou não consegue falar. Às vezes, não consegue sustentar o braço. Então, tem perda súbita da força de um lado do corpo, pode ser a perna também. Você pede para ela sorrir, e a boca está um pouco torta.”

A dica de Piscopo se resume em quatro letrinhas, que também indicam para quem você deve pedir ajudar: S-A-M-U. “Para decorar: peça para sorrir, e a boca está torta; peça para te dar um abraço, o braço não sustenta; e peça para cantar uma música, qualquer uma, e não consegue articular e/ou falar. S-A-M-U: sorrir, abraço e cante uma música.”

Segundo ele, se um dos três pedidos não for contemplado, a chance de ser um AVC é de 72%. O que fazer? Ligar para o SAMU.

“A luta é contra o tempo. Tem que chamar o SAMU e ir para o hospital certo, que tenha tomografia e equipe especializada para dissolver o coágulo, caso seja um AVC isquêmico, que acontece na maioria dos casos. Não é para pegar o carro e levar para a UPA (Unidade de Pronto Atendimento) mais perto de casa, porque se entrar no hospital errado, perde essa janela de tempo.”

Engasgo

Outra situação de emergência comum são os engasgos, que podem acontecer com adultos ou crianças em momentos de distração. Devido à dentição, idosos e bebês merecem mais atenção. Crianças pequenas também, afinal, peças de brinquedos e moedas, por exemplo, podem ser engolidas.

“Cinco mil pessoas nos Estados Unidos morrem engasgadas por ano. Não temos esse número para o Brasil”, afirma Piscopo. Nesses casos, precisamos de um “abraço da vida”, a Manobra de Heimlich. Ela vai funcionar diferente para bebês de colo e para pessoas que andam.

No caso dessas últimas, a primeira coisa é perguntar se a pessoa está engasgada. Se ela responder que sim, mas ainda consegue falar, incentive que tussa. Não dê tapa nas costas ou peça para que levante os braços. Também não tente remover o objeto. “Nunca tente enfiar o dedo para tirar o corpo estranho, porque a vítima pode morder seu dedo ou você pode empurrar o corpo estranho mais para baixo.”

Quando o bloqueio é parcial, a manobra não é recomendada. Caso o objeto seja expelido, ótimo. Caso contrário, é hora da manobra. O passo a passo é:

  • Mantenha-se de pé;
  • Posicione-se atrás da vítima;
  • Como num abraço, cruze os braços na parte da frente do corpo da vítima, um pouco acima do umbigo;
  • Com as mãos fechadas, comece as compressões, como se estivesse desenhando a letra “J”.

Repita a manobra cinco vezes, sempre observando se o objeto é expelido. Caso não, a vítima muito provavelmente vai perder a consciência. Ligue para o SAMU. A partir daí, deite-a no chão e inicie a fazer massagens cardíacas. No entanto, aqui a parada cardíaca acontecerá por falta de oxigênio, por isso, o adequado é intercalar as compressões com ventilações, a famosa respiração boca a boca.

Levante o queixo da pessoa, tampe as duas narinas – faça uma “pinça” com os dedos -, abra a boca da vítima, encha seu pulmão de ar e sopre dentro da boca até observar o peito (tórax) levantar.

  • O ideal é intercalar duas ventilações a cada trinta compressões. Há uma variação com duas ventilações a cada 15 compressões.

No caso do bebê, é diferente:

  • Coloque o bebê de bruços em cima do seu braço;
  • Deixe a cabeça mais baixa do que os pés;
  • Com a mão livre, faça cinco ”tapinhas” nas costas, entre as escapulas;
  • Coloque o bebê de barriga para cima;
  • Com os dedos, faça cinco compressões na região do peito.

Repita esse procedimento duas vezes. Se o objeto não sair, começar a RCP com ventilações.

  • Piscopo reforça que a manobra de Heimlich é para engasgo com sólidos. No caso de líquidos, é necessário fazer uma aspiração.

Afogamento

Piscopo alerta que, aqui, o principal é a prevenção. Bebeu? Não entre na água. Vai fazer uma festa perto de açude ou piscina? Coloque uma rede na piscina e tenha uma “guardião do espelho d’água”. Um adulto que não irá beber e ficará monitorando as crianças.

Se o afogamento ocorrer, o primeiro passo é retirar a pessoa do local. Isso deve ser feito por quem sabe nadar e é habilitado. Nesse caso, ligue para os Bombeiros, no 193. Também pode ligar para o SAMU, mas são os agentes da primeira instituição que são habilitados para resgate aquático.

“Se você está num local grande, uma pessoa está de jet ski, estava sem colete e submergiu. Marque aquele ponto. Se a pessoa ainda está tentando se defender, está consciente, jogue alguma coisa que boia para ela se agarrar. Jamais pule para tentar socorrer se não for treinado.”

“Para quem é treinado, fazemos cinco ventilações inconsciente dentro da água e, depois, fora da água, compressões torácicas. Trinta compressões e duas ventilações.”

Desmaio

Desmaio é definido como uma perda de consciência súbita. Bom, se você encontra pessoa desmaiada, deve lembrar que provavelmente é uma para cardíaca. Vá até os ombros, chacoalhe, chame pela pessoa. Caso não acorde ou responda, ligue 192 e inicie a massagem cardíaca.

Mas pode ser uma lipotímia. “É aquele desmaio no qual a pessoa está em pé, começa a se sentir mal, tem aquele prenúncio que vai desmaiar, fica pálida, sua. Faz uma síndrome que chamamos de vasovagal, é uma ‘queda de pressão’.”

“A pessoa começa a se sentir mal, mas quando você vai deitar essa pessoa, ela já acorda e conversa com você. Eleve os membros inferiores, converse com ela. Se a pessoa estiver conversando com você, ótimo, ela vai se recuperar. Pode pedir orientação para o SAMU se for o caso.”

Fonte: Externa

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